Irritada, entrei na plataforma. Fui direto na parte onde estão os bancos para eu sentar e esperar. Antes de sentar passei pela sua frente, senti que ele me seguiu com o olhar, não liguei muito, apenas sentei, abri a mochila e tirei meu livro. Em menos de dois minutos o trem chegou. 
Eu poderia ter entrado na porta que estava mais perto, mas fiz questão de entrar pela  mesma porta que ele entrou.
Ele estava sentado de frente para as  janelas e eu de lado. Não estávamos perto. Não estávamos longe, apenas alguns passos de  distância. Não havia ninguém no vagão além de nós, eram cerca de 20h30 da noite do último domingo do mês de junho.
Nos olhamos, mas o olhar durou mais do  que um comum olhar. Alguns segundos a mais fazem a diferença. Foi um olhar diferente. Voltei  e tentei, tentei muito me  concentrar no livro. Eu virava meus olhos pra cima,  e lá estava  ele, me engolindo com aquele olhar. Voltava para a minha leitura, para o que Arturo Bandini tinha  a me dizer, mas não consegui. Traí Arturo Bandini, preferi me concentrar neste jogo de olhares do  que as palavras tumultuadas de Bandini. Ele então deu um sorriso, um sorriso que me deixou nervosa. Minha  mão começou a suar, minhas costas.  Senti as gotinhas, as  pequenas gotas quentes escorrendo pela minha espinha. Estávamos na estação Clínicas, sabia que em breve ele iria embora e não consegui fazer nada para impedir isso. O que eu, eu poderia fazer?
Continuei fingindo que Arturo Bandini e Camila Lopez e toda aquela história, eram  mais  interessantes do que  aquilo tudo. Continuávamos a nos olhar, meus olhos encontravam os deles e ficavam se encarando cerca de segundos, segundos  que bastavam para a gente se entender. Para entender o que o outro queria. E nada, eu não poderia fazer nada,  parecia  que aquele livro,  de algumas gramas tinha  o peso do mundo fazendo  com  que eu ficasse parada,  imóvel, sem conseguir mecher uma perna, um dedo, as únicas coisas que se moviam eram  os meus olhos, e meus lábios projetando um sorriso desesperador, implorando por algum  nome,  telefone, voz.
Chegou então  na Consolação, eu tinha certeza que ele iria embora. Senti  um desespero, uma vontade de sair correndo e impedir a saída dele. Gostaria naquele momento, com todas as minhas forças que  o metrô quebrasse. Que as portas entrassem em conflito, que as luzes apagassem, que o caos fosse gerado.   Mas nada disso aconteceu e as portas abriram, ele passou na minha frente me olhando, foi aí que consegui  enxergar sua camiseta. Morte Asceta. Me deu um alívio, não seria díficil  achá-lo. Então o que eu menos queria, aconteceu. Ele saiu.  Saiu e deixou aquele vagão mais solitário do que nunca.  Seu sorriso não estava mais lá, nem seu  olhar, nem o seu tênis desamarrado, seu assento estava sozinho. E eu também.
Enquanto saía, meus olhos grudaram nele. Segui, até ele subir as escadas rolantes. E então a gente se olhou  pela útlima vez e ele fez com as mãos aquele gesto "e agora?" e as portas fecharam. 
Não existia mais irritação,  a briga que acontecera antes de eu embarcar no metrô já era inútil.  A única sensação que habitava aquele vagão marrom era o desespero para encontrá-lo em breve. Era o medo do esquecimento.
Quando cheguei no Trianon-MASP tive vontade de saltar e voltar para a Consolação  afim de encontrá-lo. Pensei em mil lugares em que ele poderia estar. Mas de tudo, seria inútil. Eu não iria fazer nada.
Não existia mais Arturo Bandini que fizesse com  que eu esquecesse essa história toda. Não adiantava, Bandini, você não conseguiu fazer com que eu achasse isso tudo ridículo.
As pessoas começaram a lotar aquele vagão, um sujeito gordo e asqueroso sentou onde o  meu amor breve estava sentado. Senti raiva, queria expulsar todo mundo daquele vagão, fazer daquele assento um altar.
Ele já estava longe de mim, eu estava quase no  meu destino. A viagem foi a mais rápida de todas.
segunda-feira, 30 de junho de 2008
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Um comentário:
eu me apaixono toda vez que ando de metrô, é incrível.
gostei do texto. =]
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